Ter sangue sardo é...
Cultivar a ilha paraíso no coração,
sem fazer da alma uma ilha.
E mesmo cruzando extensos mares,
carregar sua história milenar.
É cantar cappela e ecoar seus sentimentos ao longe, abraçando o mundo.
Numa mística forma que envolve todas
as estações e sentidos.
É ser forte e galgar alturas como muflones nos rochedos.
Ter a paciência de pastores e monges a
vigiar seu rebanho.
É não se entregar fácil aos desafios
de seus algozes, na nobreza de javalis.
Ser família, como profissão de fé
diária.
Seguir procissões e ritos, pedir a
benção do nonno nas árduas campanhas.
É não ceder ao jogo da vida, como pedras
que se moldam ao vento inclemente.
Sentir-se parte da natureza, do cosmos
às profundezas do ser, colhendo uvas.
Ter adiante das veredas, a presença
de São Miguel Arcanjo.
Agir no tempo certo, calmo como a corticeira
que se deixa cortar e servir.
Sentir-se pleno aos pés das
montanhas, com Gennargentu a nos
sondar.
É ter no vino, formaggio di pecora, pane curasao, uma conexão celestial.
Viajar pela gastronomia, como el trenino contornando serras e mar de
rara beleza.
Cultivar a arte na madeira, na
cortiça e na rocha, gravando-a para a posteridade.
Guardar n’alma, mais de sete mil
torres de enigmática beleza, uma parole
sem fim.
Desfazer-se das máscaras e do sentir Mamuthones, ao som dos sinos e ventos.
Na manhã seguinte, renascer livre e forte
como um histórico Giganti di Prama.
É dizer Io sono Sardo, cujas raízes nurágicas se perdem nas brumas do
tempo.
Quando vir a solidão, invade n’alma o
canto de launeddas ao vento.
Ou grite e ouça seu eco nas
montanhas, como puro manifesto da liberdade.
É falar de política, no ir e vir de
ideias gramscianas, de um mundo manipulado e perdido.
Tomar uma Ichnusa, quando todos os argumentos falharem na vagueza do ser.
Ter odores e sabores dos campos
floridos e entender a neve, quando tudo adormecer.
Acordar com o dia em brumas na Pinnetta, rodeado de cabras e
pensamentos.
É tudo sonhar, sem nunca ter estado
no lugar, mas viajar com a alma de Deledda...
......................
18/04/2015
Poesia de um descendente sardo.
Saudoso da ilha que ainda não
conheceu e estudioso de suas raízes.
José Capaz Dutra Cappai, 51 anos.
Nenhum comentário:
Postar um comentário